sábado, 27 de fevereiro de 2010

Radio

A compaixão é um valor difícil de explicar.
Não é ter pena, mas também não é ter empatia. É uma combinação das duas, mas vai mais além e mais fundo. Não diminui o outro, como o faz a pena. Não torna o outro igual, como faz a empatia.
Não é ser altruísta, nem ter caridade. Não procura apenas ajudar o outro. Não concede benefício, mas minora o sofrimento.
A compaixão é complexa, profunda e exigente. Não se mede por palavras e sim por actos. Não descansa na humanidade, mas encontra conforto em algo maior.

RADIO é a alcunha de um homem chamado James Robert Kennedy.
RADIO é, também, uma história de compaixão de um professor/treinador de futebol americano em relação a um rapaz diferente.

Este filme baseia-se em factos reais passados no final da década de 60 em Anderson, uma localidade da Carolina do Sul, nos Estados Unidos da América.
Radio (James) passa os seus dias a empurrar um carrinho de supermercado pelas ruas da cidade. Todos os dias pára do lado de fora do campo de treinos e assiste.
Harold Jones é professor no liceu e acumula as funções de treinador da equipa de futebol da escola. É respeitado e ouvido por toda a comunidade.
Um dia, uma das bolas de treino sai do recinto de jogo e é apanhada por James. Neste momento nenhum deles sabe mas as suas histórias estão prestes a juntar-se de forma permanente.

RADIO ilustra-nos uma época em que a palavra “integração” não existia nas escolas americanas. Havia escolas públicas e havia “instituições”. Miúdos como James, com deficiência mental, não frequentavam os mesmos locais, nem lhes eram dadas as mesmas oportunidades. O Treinador Jones, ao decidir abrir as portas da comunidade escolar ao jovem, dá início a uma luta contra as ideias retrógradas e tradicionalistas da direcção escolar e até de alguns membros influentes da comunidade local.
O percurso deste filme mostra-nos que o curso da história é mudado por aqueles que, pela primeira vez, decidem tomar um caminho diferente. Lembra que, independentemente do local onde nascemos, do que temos e do que somos, podemos sonhar. E recorda-nos ainda que, muitas vezes, o que a vida nos dá vai para além do que imaginámos.
Nesta película, um treinador que sonha ganhar um campeonato de futebol percebe que fazer alguém falar ou escrever pode ser uma vitória ainda maior; um rapaz cuja felicidade se resume ao seu carrinho de compras e ao caminho que percorre todos os dias compreende que existe um mundo maior e que a sua presença tem o poder de influenciar os que o rodeiam; uma família conclui que quanto maior é a partilha do amor que possuem, maior é a união; uma escola que baseia as suas premissas no controlo e no definido assume que, com um pouco de imprevisibilidade, pode ser melhor; uma cidade que se reúne na barbearia e vive da sua equipa de futebol apercebe-se que a verdadeira equipa é formada por todos.

A integração de Radio na comunidade escolar prova que todos temos uma função que pode e deve ser aproveitada, desde que nos sejam dadas oportunidades. Seja por amizade, por caridade, por favor, ou simplesmente por compaixão, todos temos o direito de encontrar o nosso lugar. Não só de o encontrar mas, também, de lutar por ele.

RADIO é um filme simples e despretensioso. Recorda outros filmes já aqui abordados: o Céu de Outubro pela procura do sonho e o Penélope pela força do “ser diferente”. É, no entanto, na minha opinião, um hino à compaixão, porque não posso deixar de pensar que, apesar do título ser dado em referência à alcunha de James, o Treinador Jones é, de facto, o personagem principal. Foi ele que ousou fazer a diferença, é ele que todos nós podemos ser.